Nós, adultos, temos a mania de olhar para crianças com alguma inveja sobre a facilidade da vida delas. O raciocínio é sempre o mesmo: crianças só precisam pensar em brincar, crianças não precisam ralar 10 horas por dia em frente a um computador, crianças não tem que pensar em sustentar a família etc.
Sim, é verdade: preocupações de adultos cabem mesmo a adultos. Mas não devemos menosprezar as delas.
Crianças, principalmente as mais novinhas, ainda não sabem diferenciar fantasia de realidade com a brutalidade de um adulto.
Para elas, bruxas, monstros e fadas existem da mesma forma que carros e prédios.
Para elas, uma história bem contada tem o mesmo peso de uma prova ocular qualquer.
Para elas, o que se escuta vale tanto quanto o que se enxerga.
Quer comparar preocupações? Pense você mesmo: o que seria mais preocupante? Entrar no cheque especial ao final do mês ou lidar com um dragão enfurecido escondido embaixo de sua cama?
O universo infantil não é desprovido de preocupações: ele é muito, mas muito mais recheado delas do que o nosso. E a maior dificuldade é que, quando elas compartilham alguns dos tantos medos com os adultos, eles acabam ignorando-os com a solenidade de uma parede.
O remédio para isso? Não há outro senão o próprio tempo e a maturidade que, aos poucos, vai eliminando a sensação de realidade da fantasia. Mas há, claro, como cuidar melhor dessa fase sempre tão complicada: com boas histórias.
E quando digo ‘boas histórias’, aqui, refiro-me a todo um conjunto que inclui livros com enredos bem escritos, fechados, que passem algum tipo de mensagem clara e que sejam contados com a devida empolgação pelo adulto-narrador.
Refiro-me a livros e não a filmes ou desenhos: só livros permitem que as próprias crianças desenhem os personagens e as ações em suas mentes ao invés de ver o que os outros imaginaram para ela. Livros exercitam mais o cérebro do que os olhos.
E refiro-me, sobretudo, à atenção que se deve dar ao universo da criança. A parte mais difícil de se ler uma história na hora de dormir, afinal, é saber também ler e interpretar tudo o que se passa por trás dos olhares atentos do seu filho ou filha.